sexta-feira, 29 de maio de 2015

Dia 15



Findado o dia anterior, depois de um banho quente revigorante acordei às 07h00min e comecei o preparo para a subida ao Fitz Roy (local onde me ponho a escrever agora) e para a Laguna de los Três. Como o hostel não contava com café da manhã, desci para a cozinha e lá preparei uma xícara de café, um copo de cereal com leite e alguns pedaços de pão com manteiga. Na ocasião, uma das alemãs, que estavam no mesmo quarto que eu, perguntou se estava tudo bem comigo, pois não tinha conversado muito e tinha ido me deitar cedo. Agradeci a preocupação e expliquei que estava muito cansado pela sequência de dias mal dormidos (principalmente pela noite passada na rodoviária) e também em função do meu inglês não ser assim tão fluente.

Conversamos um pouco sobre como chegar ao Fitz Roy sem tomar nenhuma van (nada que me custasse quaisquer valores), de forma independente. Depois disso encontrei um casal de brasileiros que confirmaram as informações passadas pela alemã. Iniciei a caminhada às 08h00min, depois de pegar um mapa no centro de informação para turistas (muito comum por lá) no terminal rodoviário. Já quase na saída da cidade, onde começava a trilha para o Fitz Roy, encontro novamente Scott, o nova-iorquino, dizendo que a noite anterior havia sido uma loucura segundo ele. Mal sabia como tinha chegado ao seu hostel e acordado cedo. Depois de algumas risadas, segui meu caminho.

Quando iniciei a trilha o tempo estava nublado e fazia pouco frio. Acreditava que poderia ser muito frustrante caminhar todo o percurso para chegar à montanha e não ver nada lá de cima, mas mesmo assim segui em frente. Seriam 10 km de trilha até a montanha, sendo o último deles o mais difícil (ao menos era o que todos diziam). Havia alguns avisos alertando sobre a necessidade de estar bem física e mentalmente para concluir a subida. A caminhada foi bem tranqüila, tinha dormido bem e me alimentado decentemente, o que faz certa diferença nesse tipo de trilha. À medida que ia subindo, já podia ver parte da majestosa montanha. O sol foi saindo em meio às nuvens, o tempo foi melhorando.

Conheci algumas pessoas no percurso, embora não tenha perguntado o nome de nenhuma delas, apenas conversações rápidas. No fim das contas o trecho final não foi tão duro quanto haviam dito, sendo um pouco difícil sim, de fato, mas creio que os dias em Torres del Paine serviram como uma ótima preparação física. Concluí a travessia do trecho final na metade do tempo que os avisos estipulavam. Quando finalmente cheguei ao topo da montanha, lá estava o tal Fitz Roy, sem uma única nuvem que pudesse atrapalhar a visão. Simplesmente sensacional aquela vista! Cheguei ao topo às 11h00min e só desci de lá às 16h00min. Passei o dia todo contemplando aquela beleza toda. Tirei fotos, escrevi, admirei, tudo o que imaginava foi superado. Tive até o previlégio de fotografar três condores que nos deram o prazer de contemplar seu vôo (eles praticamente não batem suas asas, apenas planam pelas correntes de ar), um espetáculo à parte!

Pelo tempo que lá fiquei busquei pensar bastante na vida, fazer planos, observar as pessoas, etc. Uma oportunidade imperdível para colocar em ordem seus pensamentos! Nessas observações, havia um senhor que já passava dos 50 anos, estadunidense, conversando com duas gurias bem jovens, uma argentina e outra catalã. Chamou-me a atenção, pois o tiozão tinha um telefone via satélite, o que possibilitou que as gurias fizessem ligações para suas respectivas casas dizendo estar no alto da montanha em “muy buena onda, muy contentas!”. Muito tecnológico aquele senhor. Do pouco que prestei a atenção, pude ouvir (“sapear” na verdade) que aquele senhor havia investido dinheiro no mercado de ações nos anos 80, ganhando muito dinheiro, o que possibilitou pedir demissão do seu antigo emprego pra curtir a vida. Mais estadunidense que isso impossível!

Sem vontade alguma de sair dali, resolvi caminhar um pouco pelo topo. Foi aí que descobri a tal Laguna de los Três, escondida por detrás da montanha. Trata-se de três pequenas lagoas formadas pelo degelo da montanha, cada uma em um plano diferente, tornando-se impossível fotografá-las numa só foto. Depois de mais alguns instantes admirando as cachoeiras formadas pelo degelo, resolvi que era o momento de iniciar a descida. A todo o momento parava e olhava para trás a fim de contemplar aquela paisagem mais uma única vez. Tirei uma sequência de fotos iguais, pra não perder sequer uma única visão daquilo. No meio da descida encontro novamente Scott (fato recorrente em toda a viagem) subindo a montanha (de sandálias).

Finalizada a descida, tomado por um sentimento de realização intenso, passei numa pequena venda e comprei algumas frutas com a grana que e restava. Assim que cheguei ao hostel tomei um banho e desci para a cozinha a fim de comer algo, estava faminto. Lá havia três israelenses preparando hambúrgueres e duas gurias fazendo purê de batatas. Comi alguns pães com presunto, cereal com leite e frutas que havia comprado quando retornei do trekking. As duas gurias, uma alemã chamada Hanna e sua amiga austríaca, Júlia, disseram que eu era muito saudável, pois estava a comer “slow food”. Disse a elas que tinha vontade de comer “hamburguesas” bem como os israelenses, mas o que me restava era a comida saudável. Percebi que não estava tão mal assim, pois comer purê de batatas puro não é das melhores refeições, devo admitir. No final do papo Hanna foi muito simpática ao me convidar para assistir um filme de graça que ia rolar numa livraria na cidade.

Ao subir pro quarto, a fim de descansar, chegaram duas novas pessoas, até então só estavam eu e duas alemãs. Agora chegaram Chelsea, da Austrália e John, de Cingapura. Conversamos um pouco em inglês, o tempo suficiente pro meu vocabulário acabar, rs! Chelsea me contou que seu cartão de crédito havia sido clonado e todo o seu dinheiro sacado nas Filipinas (!), isso mesmo! Já tinha entrado em contato com o banco e aguardava a restituição por parte deles. Conversei um pouco com John, quando pude ter algumas impressões do ensino básico no seu país. O maluco tinha no máximo uns 20 anos, embora aparentasse uns 15 no máximo, mas era muito inteligente. Depois dessa conversa, pedi se poderia apagar a luz e capotei.

Início da trilha.

Río de las Vueltas

Chuva indo embora, descobrindo a montanha.

Fitz Roy!



 
Na volta pra Chaltén, sempre que olhava pra trás essa era a vista!

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Dia 14



Despertei às 06h00min, escovei os dentes e fumei um cigarro. Adquiri esse hábito durante minha estadia no parque, pois em meio a toda aquela imensidão não há muita coisa a se fazer, então um cigarro e uma conversa se torna algo prazeroso (além de esquentar um bocado). Ao meu lado estava Renata, uma brasileira do Rio de Janeiro que dormiu num banco ao meu lado. Na ocasião me orientou a não perder tempo procurando hostel pela cidade, pois todos estavam lotados, como já desconfiávamos.



Resolvi que o melhor a se fazer era ir a El Chaltén com passagem de volta já comprada, pois meu vôo sairia dali mesmo, Calafate, no domingo. Depois de uma rápida pesquisa pelas empresas que faziam o trajeto, consegui um passeio de ida e volta ao Perito Moreno (ali mesmo em Calafate) saindo às 08h30min e retornando às 16h00min. Além disso, consegui uma passagem pra Chaltén na seqüência desse passeio, no mesmo dia, com retorno marcado para o domingo (como havia planejado). Dessa forma, haveria tempo de conhecer o Perito Moreno, ir até Chaltén para completar o trekking ao Fitz Roy, e voltar em tempo de pegar meu vôo a Buenos Aires.

- passagem de ida e volta ao Perito Moreno e ida e volta a Chaltén: 782 pesos

- entrada ao Parque Nacional Los Glaciares (Perito Moreno): 150 pesos

- torta na rodoviária: 20 pesos

- guarda-volumes no terminal rodoviário: 10 pesos



A ida ao Perito Moreno seria de aproximadamente uma hora. Como a noite anterior sido péssima, senti sono por todo o trajeto. Assim que chegamos à entrada do parque um funcionário subiu ao ônibus para cobrar os tickets de entrada. Assim que todos pagaram o motorista seguiu até uma embarcação para àqueles que quisessem fazer um passeio pelo Lago Argentino, se aproximando bastante dos paredões de gelo. O detalhe é que para tal passeio o cidadão deve desembolsar mais 200 pesos. Se nem os turistas gringos se deram ao luxo de desembolsar seus euros, imagine eu, só mais um cidadão latino americano. Um absurdo! Dois ou três passageiros optaram pelo passeio, mais ninguém. Assim seguimos para as passarelas a fim de conhecer o Campo de Gelo Sul.



A visão que se tem do paredão é magnífica! Na parte da frente, se tem a sensação da magnitude da imagem, 50 metros de altura. Em sua profundidade, o campo de estende por 14 km. Se perde a visão de tudo, em sua totalidade. A cada desprendimento de pedaços do paredão gelado se tem um espetáculo fabuloso. Um estrondo marca a queda dos pedaços de gelo na água, coisa de toneladas. Dizem que uma camada de 1 metro se desprende a cada dia. Paro o relato por aqui por um instante, pois escrevo essa parte observando a magnitude do Fitz Roy, mas um grupo de turistas gringos, já de mais idade, quebrou minha harmonia. Sentaram ao meu lado para desfrutar do seu almoço que o seu passeio guiado (e muito mais caro, provavelmente) lhes proporcionou. Realocado a alguns metros mais longe, agora sem escutar a voz histérica das senhoras gringas, retomo a descrição.



Voltemos ao Perito Moreno. Um conjunto de passarelas metálicas circunda a imensidão gelada. A verdade é que em alguns minutos já se pode ver tudo, e os mais apressados já sobem logo para a loja de lembranças e para o café, a fim de consumirem algo. Mesmo com os joelhos me matando por conta da trilha finalizada há dois dias atrás, fiz questão de percorrer tudo, afinal de contas só eu sei o sacrifício que fiz para desfrutar daquele momento. Depois de cerca de duas horas de caminhada sobre as passarelas e muitas fotos tiradas, subi ao café para comer algo. Tomei uma Isenbeck (cerveja argentina de puro malte muito bem recomendada) e comi um sanduíche de carne a milanesa y queso, muito generoso. Uma vez alimentado, fumei um cigarro, daqueles ainda presenteados pelos catalães. Foi aí que me bateu um sono tremendo, cheguei até a cochilar sentado num banco. A fim de vencer o sono, fui até a loja de lembranças para ocupar a cabeça, já que grana eu não tinha pra mais nada!



Foi ali que pude perceber que alguns brasileiros só fazem esses passeios com o intuito de comprar coisas baratas. Não todos, é claro, não quero cair em generalismos. Andando pelas prateleiras, em silêncio, vejo dois senhores que aparentavam ter seus 50 anos. Um deles pegou um par de meias e disse: “Vou levar, não se encontram meias baratas assim no Brasil!”. Porra, o cara foi pra Argentina, acabou de conhecer um dos maiores campos de gelo do Hemisfério Sul e vai levar meias pra casa? Bem, quem sou eu pra julgá-lo, cada um sabe bem onde seu calo aperta.



Bem, depois de matar algum tempo até a chegada do ônibus, embarcamos de volta à Calafate às 14h30min. A volta foi um tanto tediosa, dormi grande parte do trajeto. Chegando ao terminal fui logo esperar meu próximo ônibus que me levaria à Chaltén. O ônibus saiu do terminal rodoviário quase vazio, vim sentado no primeiro banco, dessa vez sem ninguém ao meu lado. Observei a estrada por todo o percurso, com medo do motorista dormir, pois se trata de retas intermináveis, seguidas de algumas poucas curvas nada acentuadas.



Três horas depois chegamos a Chaltén, a capital nacional do trekking, onde conheceria o local de onde escrevo agora. Antes, uma breve descrição do que encontrei. Trata-se de uma cidade muito pequena, talvez a menor pela qual passei até agora. Assim que cheguei já avistei um hostel ao lado do terminal rodoviário e logo fui perguntar o preço da diária. Seriam 160 pesos. Achei o preço justo pela estrutura e fiz check-in sem ver outros valores. Deixei minha mochila no quarto e fui logo dar uma volta pela cidade a fim de fazer câmbio. Passando por outros locais vi que havia preços mais acessíveis, embora com estruturas mais precárias. Logo vi que o câmbio para o Real na cidade seria péssimo (3,10 pesos para cada Real – estava cambiando a 4,5 nas cidades anteriores) e assim teria que passar os dois dias ali na penúria, se não quisesse perder dinheiro.



Fui logo a uma pequena venda e comprei pão, um pacote de cereal, uma caixa de leite, uma caixa de suco de laranja, duas pequenas barras de chocolate, uma caixinha de manteiga e só. Soma-se a isso uma bandeja de presunto embalada a vácuo e um pote de doce de leite, que me restaram da trilha. Isso seria meu suprimento alimentício pelos próximos dois dias que teria pela frente. Nessa mesma vendinha fiz câmbio de R$ 100,00 para pagar a despesa do hostel. Sendo assim, voltei ao hostel pra descansar pro dia seguinte, que seria longo.

- compra de mantimentos: 108 pesos

- diária de dois dias no hostel: 320 pesos
Perito Moreno - Parque Nacional Los Glaciares


Na parte do gelo que parece estar "suja" ao centro da foto, havia uma espécie de arco que conectava a geleira com as pedras. Em março de 2004 esse arco se rompeu, evidenciando o processo de degelo.



Onde havia o tal "arco".

 Passarelas metálicas, muito bem construídas!


 
Pássaro comendo o fruto que dá nome à cidade (Calafate).

El Chaltén, a capital nacional do trekking.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Dia 13



No dia seguinte acordei às 09h00min para aproveitar o café do hostel. Assim que comi comecei a arrumar minhas roupas na mochila novamente (estavam em sacos pretos, deixados numa espécie de guarda-volumes do hostel, para que a mochila estivesse livre pra sua utilização no circuito W). Assim que as coisas estavam minimamente organizadas fui buscar minhas roupas que havia deixado na lavanderia no dia anterior. Elas voltaram minimamente limpas, com um cheiro bom, embora um pouco encardidas (limpas mesmo só serão no Brasil).

Retornei ao hostel e preparei minha mochila para partir no fim da tarde, às 18h00min, com destino a Calafate. Como teria a tarde toda livre, resolvi andar pela cidade para conhecê-la, tirando algumas fotos. Também fui ao correio para enviar alguns postais que havia comprado em Ushuaia, mas não tive tempo de postar. Nessa caminhada encontrei alguns rostos conhecidos que estavam acampando no decorrer do circuito, entre eles Javiera e Cristóban, que conheci no primeiro dia de camping. Ambos eram chilenos de Santiago. Conversando com eles descobri que também iriam a Calafate no mesmo ônibus que eu.

Bom, retorno agora ao horário do almoço, pois já ia me esquecendo dos amigos André e Fernanda, que conheci no dia em que cheguei a Puerto Natales, na loja onde aluguei os equipamentos. A partir daí se sucederam uma série de “encontros”. Assim que retornei da rua para o almoço no hostel, estavam os dois almoçando e gentilmente me convidaram para sentar com eles, no próprio hostel onde estava hospedado (Josmar Hostel). Estavam tomando a mesma cerveja que eu havia comprado pro almoço, uma Austral de 1 litro. Conversamos sobre os dias no parque, as dificuldades do trajeto, nossas ocupações no Brasil, entre outras coisas. Logo na seqüência do almoço os dois iriam a Punta Arenas, assim selamos nossa amizade com uma foto. Muito simpáticos os dois!

Voltando agora ao final da tarde, retornei ao hostel para carregar a bateria do meu mp4 para a viagem que faria no fim do dia. Fiquei aguardando o funcionário do hostel que me levaria à rodoviária (como reservei as passagens no próprio hostel, eles oferecem esse serviço de nos levar até o terminal de ônibus). Na espera do ônibus, já no terminal, encontrei Javiera e Cristóban e ficamos conversando até a chegada do nosso ônibus, que por sinal atrasou uma hora. A saída, que estava marcada para as 18h00min, só foi acontecer às 19h00min.

Depois de pouco menos de meia hora de viagem paramos na fronteira do Chile para quitar nossa situação junto à imigração. Seguindo viagem, nova parada no lado argentino, para dar entrada no país, normalmente. Depois de muita espera seguimos finalmente viagem para Calafate. Mesmo agasalhado passei muito frio no ônibus. Consegui dormir no trajeto e acordei somente quando chegamos à Calafate, por volta das 02h00min. Como já era muito tarde e tínhamos a informação de que não haveria vagas em nenhum hostel (devido ao Festival do Lago, que receberia a banda Calle 13 como atração principal, entre outras), resolvemos passar a noite no próprio terminal rodoviário.

Apesar dos vários avisos fixados à parede dizendo ser proibido pernoitar, permanecemos ali mesmo, já que não havia outra opção. Os próprios policiais faziam “vistas grossas” à nossa permanência por ali. Fazia muito frio na cidade, nenhum deles, em sã consciência, nos colocaria pra fora daquele local. Javiera e Cristóban se juntaram a mim próximo a um aparelho de calefação para nos esquentarmos minimamente. Os dois tinham sacos de dormir e os estenderam no chão, logo dormindo.

Eu só tinha um pote de doce de leite que havia me restado da trilha. Depois de algumas colheradas, estendi no chão a capa da minha mochila e me acomodei dentro dela, utilizando a mochila como encosto. Fazia tanto frio que não conseguia pegar no sono, então resolvi ler um pouco pra que o sono chegasse. Depois de pouco mais de 30 páginas lidas (do livro De moto pela América do Sul, que conta a viagem feita por Che Guevara e seu amigo pelo continente) finalmente me acomodei e consegui pegar no sono. Acordei algumas vezes durante aquela noite fria, mas creio que tenha conseguido dormir umas duas horas completas.
Localização do Josmar Hostel (foto essencial pros "desorientados" como eu)

Praça em Puerto Natales



Vista que se tem da pista de skate da cidade.

No canto direito, monumento aos ventos.
Cristóban y Javiera

André e Fernanda

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Circuito W: 5º dia



No meu quinto e último dia no parque levantei às 03h30min a fim de chegar ao mirador das Torres para ver o Sol nascendo projetando seus primeiros raios nos paredões de pedra, deixando-os com uma tonalidade alaranjada. Havia uma caminhada muito dura a ser feita, pois o acampamento estava a 400 metros de altura e o mirador fica a quase 900 metros, sendo que seria uma caminhada noturna, pra dificultar mais ainda a subida.

Levei comigo o saco de dormir, seguindo a dica de um chileno que mora no Rio de Janeiro há alguns anos, em função do forte frio que faria nas primeiras horas da manhã, sem o calor dos raios solares. Depois de se perder na trilha umas três vezes, chegamos ao mirador, eu e Eduardo (Taís e Rafa ficariam no acampamento, e Marcelo nós só encontraríamos mais tarde). A vista lá de cima é sensacional! Abaixo das Torres se forma um pequeno lago, formado pelo degelo da neve das Torres. Com certeza compensa muito todo o desgaste da subida e o frio enfrentado.

Chegamos lá quando ainda estava escuro, abrimos os sacos de dormir e esperamos. Mesmo com toda a roupa e o saco de dormir ainda passei frio Fico imaginando como seria se não tivéssemos levado em conta a dica dada pelo chileno. Lá encima encontramos Marcelo, que havia dito que não iria, mas acabou sendo convencido por Scott a encarar a subida. “Marcelow, are you coming or not?”, foi o que disse Scott, aos gritos no meio da madruga. Infelizmente não podemos acompanhar o tal espetáculo dos paredões de pedra com a tonalidade alaranjada, pois o tempo estava fechado. U pouco frustrante, mas nada que estragasse a beleza daquela paisagem. Depois de tirar muitas fotos, começamos a descida. A parte engraçada ficou por conta de Scott, uma figura: fez a trilha ainda meio embriagado pela noite anterior, e sem lanterna. Chegou ao mirador das Torres e enquanto todos batiam fotos e curtiam a paisagem, ele deitou e dormiu. Figuraça!

Apressei-me na trilha e logo deixei Marcelo e Eduardo para trás, pois queria tomar um banho antes de desarmar a barraca, partindo a tempo de tomar o ônibus das 14h30min (o próximo seria somente às 19h45min). Percorri um trecho de muitas subidas e descidas até o Hotel las Torres, cerca de 5 km em uma hora cravada. Novamente os mineiros ficariam para trás, pois acreditaram que não haveria tempo suficiente para chegar até o hotel, e depois até a Laguna Amarga, de onde sairia o ônibus. Talvez não houvesse tempo mesmo. Eu acabei chegando a tempo, mas pelo fato de ter corrido boa parte do trajeto. Cumpri a meta que havia estabelecido, mas o preço foi cobrado pelos meus joelhos. Senti dores mesmo após o retorno ao Brasil.

Fui um dos primeiros a chegar até o hotel, às 11h00min, e teria de aguardar a van que nos levaria até a Laguna Amarga (local de partida do ônibus) até as 13h00min. Logo chegaram Scott e Brad e ficamos conversando. Scott me cedeu alguns biscoitos e eu, um cigarro. Logo na primeira van que chegou eu me mandei, logo depois de me despedir dos novos amigos nova-iorquinos. Antes de ir embora pude presenciar a festa feita por um grupo de paulistanos que concluíam o circuito “O”, que percorre todo o parque, em nove dias, creio eu.

O caminho de volta a Puerto Natales foi tomado por um sentimento de realização e desgaste. Liguei meu mp4 numa playlist que preparei para a viagem, mas na segunda ou terceira música já estava dormindo. Sentar naquele acento macio e confortável foi um manjar dos deuses. Havia pouca conversa, as pessoas pareciam estar todas com o mesmo sentimento de realização e cansaço.

Assim que cheguei ao terminal de ônibus fui direto à loja onde aluguei meus equipamentos de camping (não via a hora de me livrar de todo aquele peso). Fui atendido pela mesma mulher que me cedeu os equipamentos. Quando me atendeu pela primeira vez pareceu ser um pouco grossa, talvez pela correria do seu trabalho (havia algumas pessoas e ela atendia a todos sozinha). Desta vez me atendeu muito bem, foi logo me dando um beijo no rosto e perguntando como tinha sido a experiência. Vendo o cansaço estampado na minha cara, foi muito gentil ao me dar um bolo que havia feito.

Saindo dali fui logo ao hostel onde tinha deixado minhas coisas, e como havia lugares disponíveis, optei por passar a noite ali mesmo. Tomei um banho e mesmo sendo um pouco cedo para jantar, pedi meu prato de “milanesa de vacuno y papas fritas”. Uma porção muito generosa, diga-se de passagem. Pra acompanhar, uma Cristal de 1 litro, cerveja essa que não me agradou (não faz espuma, parecia um guaraná). De banho tomado e de estômago cheio, fui buscar uma lavanderia pra lavar minhas roupas usadas na trilha.
- diária do hostel: 8000 pesos chilenos
- jantar: 7000 pesos chilenos
- lavanderia: 6600 pesos chilenos
- cervejas: 2600 pesos

Feito isso, passei num mercado e comprei duas Coronas para acompanhar a estréia do São Paulo na Libertadores, contra os gambás (acabamos perdendo por 2 x 0). Como o jogo não estava do meu agrado, rs, tomei as duas garrafas conversando com a Ju no whatsapp, estava com muitas saudades dela, o papo serviu pra diminuir um pouco a sensação de distância. Depois da conversa fui dormir.
As Torres!

A minha é uma dessas, tá aí no meio!

Hotel Las Torres

Marcelo, Dudu e eu


Circuito W: 4º dia



Na manhã do quarto dia levantei às 06h10min como havia planejado na noite anterior. Saí da minha barraca e fui até os mineiros avisá-los de que sairia em duas horas. Assim que os avisei retornei à minha barraca para começar a desmontá-la. Como o camping era nas margens do lago onde se formavam os redemoinhos, ventava muito e de modo constante. Pra piorar, formava-se um tempo chuvoso no alto da montanha, e com o forte vento, logo o mau tempo estaria sobre nossas cabeças. Apressei-me para não pegar aquela chuva gelada logo cedo. Não adiantou muita coisa, começou a chover enquanto dobrava a barraca pra sair. Terminei o processo sem sentir minhas mãos, juntei minhas coisas e fui até o banheiro pra jogar uma água quente nelas, reduzindo assim a sensação de frio.

Estava tão agradável a temperatura dentro do banheiro que meu café da manhã foi consumido ali mesmo. É bem verdade que não foi um café convencional: comi metade de um salame e meti o pé na trilha. Seriam 11 km de muita subida, mal sabia o cansaço que iria me bater. Saí do Acampamento Los Cuernos às 08h10min com destino ao Acampamento Chileno. Apesar da grande distância a ser percorrida, fiz o trecho em 4 horas, tamanha era minha vontade de sair daquele acampamento onde estava muito mal instalado. Parti sozinho, pois os brasileiros não se aprontaram no tempo combinado, preferindo dormir por mais algumas horas.

Esse foi um dos trechos mais difíceis do circuito, mas me saí muito bem estando sozinho. Nesse percurso se vê paisagens fantásticas e poucas pessoas em função de ter saído cedo pra caminhada. Depois de muito sofrimento (muito mesmo, cheguei até a conversar comigo mesmo pra me motivar a seguir adiante), finalmente cheguei ao Acampamento Chileno. Já perto da chegada pude visualizar dois condores alçando vôo no alto de uma montanha. Fiquei os observando por algum tempo, e quando finalmente decidi filmá-los, a bateria da minha câmera acabou. Enquanto fui pegar a bateria reserva que estava na mochila, eles sumiram e não deram mais o ar da graça. O registro ficou só na minha memória.

Chegando ao Acampamento Chileno, de imediato já pude notar a boa estrutura do local. Pela primeira vez no parque pude aproveitar o camping. Assim que cheguei peguei o primeiro bom lugar que encontrei para armação da minha barraca. Depois de armá-la, a primeira coisa que fiz foi tomar um banho quente, minhas pernas já pareciam andar sozinhas. Após o banho preparei uma sopa com macarrão que acabou ficando ótima. A fome era tão grande que joguei algumas fatias de pão dentro da mistura e ficou excelente. De barriga cheia e com o corpo e roupas limpas, deitei dentro da barraca e dormi por cerca de 3 horas, quando os brasileiros chegaram e me acordaram na minha barraca (isso já era por volta das 18h00min).

Depois que armaram suas barracas fomos preparar o jantar. Em todo o percurso até o momento, não havia me sentido descansado como me sentia nesse momento. Quanto ao jantar, foi a melhor refeição que fizemos em toda nossa estadia no parque. Comemos macarrão com molho bolonhesa, purê de batatas e atum, uma verdadeira delícia gastronômica naquelas condições. Como aquela seria nossa última refeição juntos, juntamos tudo que nos tinha restado nas mochilas, daí vem tanta fartura. Enquanto cozinhávamos, nossos novos amigos nova-iorquinos Scott e Brad se juntaram a nós na conversa. Muitos gentis nos cederam algumas taças de vinho que bebiam. Comemos fartamente!

Quando já estava na minha barraca escrevendo este diário recebi a visita de um funcionário do camping perguntando se eu já havia pago pela estadia. Disse a ele que não e por conta disso tive de ir até o quiosque quitar o tal ticket. O tradicional jeitinho brasileiro não funcionou desta vez (já haviam funcionado no primeiro e terceiro dia, quando os campings também eram pagos).  Não tenho do que reclamar, os 8500 pesos chilenos pagos pela estadia valeram muito a pena, já que aquele tinha sido um ótimo dia de descanso.
- estadia no camping: 8500 pesos chilenos

Antes de irmos pras barracas, deixamos previamente combinada nossa partida, que seria na madrugada do dia seguinte. Queríamos chegar ao trecho final do circuito, as tão aguardadas Torres, com o dia amanhecendo. Para isso, teríamos que iniciar a subida por volta das 4 da manhã, fazendo uma caminhada noturna pela trilha. 
Deixando a chuva pra trás


Aquela que não me abandonou nunca!

No fim da descida, Acampamento Chileno

Minha única "selfie" da viagem!

Nosso banquete!

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Circuito W: 3º dia



Na manhã do terceiro dia, deixamos as barracas montadas no Acampamento Italiano e partimos para uma caminhada no Vale Francês, sem as mochilas. Já conhecia a fama do local, tanto por sua paisagem, que prometia ser uma das mais belas do parque, bem como por sua dificuldade. Mesmo tendo já um panorama daquilo que encontraria, me surpreendi muito com o que vi. Trata-se de uma subida margeando um rio de forte correnteza. Depois de aproximadamente 40 minutos de subida, se chega ao mirador do Vale Francês, simplesmente impressionante! As fotos não dão conta de retratar a beleza do local e a imponência dos paredões rochosos.



Quando você pensa que não pode melhorar, sobe por mais uma hora e chega ao mirador Britânico. A vista mais bela de todo o parque em minha opinião. Nele se tem uma visão de todas as formações rochosas, em 360º, muito louco! O frio que faz lá em cima é fora de série, e o vento forte aumenta ainda mais a sensação, mas nada que estrague a felicidade e o sentimento de realização plena. No topo, subimos em algumas pedras em busca das melhores fotos, sempre numa batalha pelo equilíbrio contra o vento forte e intenso.



Depois de muitas fotos descemos de volta ao Acampamento Italiano para seguir o roteiro até a próxima zona de camping, que seria razoavelmente perto dali, a duas horas e meia de caminhada apenas. Levantei minha barraca e parti sem os brasileiros de Minas, pois me apressei na descida e ganhei algum tempo. Essa caminhada, sozinho, foi muito reflexiva para mim. Você se conecta com a natureza e com seus pensamentos, não escuta se quer uma alma viva, só o barulho da paisagem, do vento soprando forte e levantando a água do imenso Lago Nordernskjöld, formando redemoinhos.



Chegando ao camping Los Cuernos, tive uma infeliz surpresa, pois não havia lugares para a armação das barracas. Acabou me restando uma única opção, um local cheio de plantas pontiagudas num terreno levemente inclinado. Foi o que me restou, e é fato que isso não estragaria as belas imagens registradas na minha memória. O ponto positivo é que tinham banheiros com ducha quente. Meu corpo precisava disso depois de três longos dias de caminhada carregando cerca de 12 kg nas costas.



Depois de um bom banho, me juntei aos brasileiros para cozinhar o jantar. O humor deles estava péssimo, pois além de não encontrar bons lugares para suas barracas, Marcelo e Rafa foram os “escolhidos” pelo staff do local para pagar à diária do camping (a água quente tem seu preço!). Depois de conseguir com muito custo um cantinho para suas barracas, começamos o preparo do jantar. No refeitório fomos surpreendidos por funcionários do camping nos dizendo que deveríamos sair dali, pois estava no horário de fechar. Argumentei com o rapaz que tínhamos de terminar o cozimento do macarrão, pois aquela seria nossa única refeição depois de um dia longo. Sem engolir muito minha argumentação, o rapaz acabou nos deixando terminar o macarrão, do lado de fora do refeitório. Lutamos para que o forte vento não apagasse nosso fogareiro.



No fim das contas esse “desentendimento” entre nós e o funcionário do camping nos rendeu bons risos. Terminada a refeição, fui até o banheiro lavar as louças utilizadas. Combinei com os brasileiros que na manhã do dia seguinte levantaria as seis para partir as sete, com ou sem eles. A caminhada seria longa, cerca de 11 km, sendo composta em sua maioria por subidas. Tinha a intenção de sair cedo para chegar a tempo de escolher um bom lugar no próximo camping, podendo assim descansar, finalmente.
Vale Francês

Mirador do Vale Francês

Dudu (de suspensório) e Tais




Pequena praia formada por pedras, Lago Nordernskjöld


Mirador Britânico

Lago Nordernskjöld